segunda-feira, 11 de maio de 2015

[OPINIÃO] – A confissão do irmão Haluin - Ellis Peters



Olá prezado leitor. Que as garras do tempo sempre se mantenham longe de seus livros.
E a frase do dia é: "Os problemas da casa de um homem são assunto dele, e era melhor deixar que ele os resolvesse. É um gesto de civilidade oferecer ajuda, mas um ato de sabedoria ceder com elegância." Ellis Peters

Hoje falamos, no Cantinho da traça, de mais uma obra de investigação, ao modelo Sherlock Holmes, mas ocorrida na Idade Média.

Falo de A confissão do irmão Haluin (Editora Record, 238 pág), de Ellis Peters, escritora inglesa de renome, que escreveu uma série de livros  em que casos de assassinato e mistérios familiares são investigados pelo seu personagem principal, o irmão Cadfael.

A autora
O romance relata as desventuras de um irmão beneditino, Haluin, que ao sofrer um acidente que põe em risco a sua vida, decide confessar-se com Cadfael. Apesar disso, ele se cura. Junto com seu confessor, ele vai em busca de uma penitência em que obterá o perdão pelo que revelou em seu leito de morte. 

Na jornada, não haverá apenas as dificuldades das sequelas do seu acidente, mas, também, interessados em abafar o que foi confessado. E isso envolve famílias nobres, escândalos amorosos, além de luta pelo poder.

Capa da edição nacional.
Ao estilo Agatha Christie de investigação, esta é uma trama que envolve nobres, monges e servos dentro de uma sequência curiosa e interessante, dirigida pelo irmão Cadfael. É mais uma obra que pode interessar os leitores apaixonados por tramas investigatórias, mas que desejem uma situação diferenciada em um contexto diferenciado. Para quem curte romances ocorridos em Idade média, também vale a pena ser lido.

A autora e seu personagem principal, Irmão Cadfael

Não é nada que já não se haja sido visto neste tipo de literatura, mas tem descrições bem legais e deduções interessantes sobre os mistérios da história de Haluin e sua família. O contexto medieval dá uma característica sombria e limitada à atmosfera da obra. Sem a tecnologia moderna de investigação, o irmão Cadfael encontra desafios ao seu trabalho que o tornam um exímio detetive focado menos em evidências e mais nas inconsistências dos suspeitos.

O léxico da autora é simples, mas guarda muito do requinte e circunspecção que adoro na literatura inglesa. Sem ser prolixa, ela insere o leitor na trama sem provocar alarde; aos poucos nos vemos imersos em sua teia magnífica de palavras. Sou admirador da sua obra.

Abraço a todos,

M.M 

Sobre a autora: Ellis Peters
Nascida em 28 de setembro de 1913, e falecida em 14 de outubro de 1995, Edith Mary Pargeter foi uma escritora inglesa que trabalhou em muitas categorias literárias, dentre elas a histórica e a ficção histórica. Produziu uma vasta obra tanto usando seu pseudônimo como o nome verdadeiro. Como Ellis Peters, escreveu 21 livros de As Crônicas de Cadfael.

domingo, 19 de abril de 2015

[OPINIÃO] – O Retrato (Gogol) – E se uma pintura fizesse toda a diferença?



Olá, caros acompanhantes das aventuras do Cantinho da traça, que as capas de cada livro os continuem inspirando mais e mais a cada dia.

 E a  frase do dia é: “Eu acredito na salvação da humanidade, no futuro do cianureto”Emil Cioran.

Hoje estamos aqui para falar de um livro singular: O Retrato, de Gogol (Coleção de 64 páginas, L&PM, livro de bolso), um dos marcos da literatura Russa do século XIX.

Dividido perfeitamente em 2 partes distintas, o conto começa com o jovem pintor Tchartkov descobrindo um quadro velho e esquecido, que é comprado por uma pechincha em uma galeria. O conteúdo da obra de arte é um retrato pintado de um homem com qualidade que o impressiona a ponto de possuí-lo com o pouco dinheiro que lhe restava para comer. É que Tchartkov está em dificuldades financeiras e, como artista, busca a evolução de sua arte, não o enriquecimento.


O autor
Já em casa, com o senhorio (dono do apartamento alugado) em seu pé para despejá-lo por falta de pagamento, Tchartkov se atém a investigar o retrato que lhe chama a atenção. E descobre o que foi. E assim sua vida começa a mudar.

Mas, o que chamava a atenção do pintor para um retrato velho de um velho homem moreno? Que homem misterioso era esse para ter uma pintura tão viva e tão real?

Os olhos. O olhar. Tão vivos, tão reais e tão perfeitamente assustadores que começam a perturbá-lo em seus sonhos.

E não é que isso lhe traz ganhos? O que você acharia se seu sonho pudesse lhe mostrar onde encontrar riquezas?

Imagem usada na capa de uma das edições nacionais
Mas essa riqueza tem um preço: a arte, a que Tchartkov planejara desenvolver, ficou para trás com a projeção profissional que ele consegue pintando retratos. Ele se torna famoso a ponto de fogir de seu rumo que, apesar de mantê-lo pobre, o mantinha um grande artista. Mas, isso, só vai descobrir mais à frente, de uma maneira terrível.

A segunda parte do livro conta a origem do quadro e do misterioso homem retratado nele. Uma origem controversa e questionável para uma sociedade iluminada como a do século 19, que leva ao conhecimento de uma força primeva e hostil.

Falando de um mal que se perpetua por gerações, que contamina sorrateiramente o coração das pessoas que o abrigam, Gogol dá um passo muito interessante neste conto: será a inveja humana, sua vaidade e seu egoísmo a motivação de suas misérias? Será que vemos nossa imagem refletida na imagem dos outros? Estaria o diabo nos outros ou em nós?

Estas são algumas reflexões que este maravilhoso conto nos traz, mas vocês podem achar muitas outras coisas nessa história fascinante, que vai além da psicologia humana e mergulha no fantástico sem pudor.
Ponto para Gogol.

M.M

sábado, 14 de fevereiro de 2015

[OPINIÃO] – Contos Apimentados – Porque sou baiano…



Olá, prezados aventureiros das páginas de papel, que a cola da vida mantenha as suas páginas sempre juntas para jamais se desmantelarem…

E a frase de efeito do dia é: “Nunca é uma palavra longa demais”. – J.R.R Tolkien

Um de muitos livros
Hoje estamos aqui para falar de uma antologia de contos Made in Bahia. Venho divulgar a obra de uma autora baiana, arretada, de muito respeito e prestígio no meio literário baiano. Ela fundou a editora Pimenta Malagueta, editora com raízes nordestinas, e é conhecida como Miriam de Sales.

É importante saber que Miriam é autora com nome conhecido internacionalmente e nacionalmente, a exemplo de sua participação constante em eventos como Salão Internacional de Turim, seletas de contos e revistas e jornais do meio literário. Tem uma revista onde publica textos de autores baianos, com edição impressa, O Beco das Palavras, além de inúmeros blogs e perfis no Facebook.

Logomarca da Pimenta Malagueta

Com 126 páginas de contos e crônicas realmente apimentados, todos ambientados no Estado da Bahia, a obra conta um pouco mais sobre esta terra incompreendida pelas outras "tribos tupiniquins", seu povo, seus costumes, tradições, dizeres e, o melhor de tudo, humor.

Os textos são curtos, práticos e muito bem humorados. Neles, Miriam leva seu leitor a momentos em que  se pega rindo sem perceber. O efeito, além de terapêutico, é crônico e aprofundado.

A autora em um de seus eventos internacionais
Esperta em seus estilos, sagaz e diretiva em sua forma de abordar o cotidiano, a autora mostra com essa obra que a literatura baiana tem o que acrescentar ao macrocosmo literário nacional. Ela fica cara a cara com autores renomados como Jorge Amado, João Ubaldo Ribeiro, Zélia Gattai e outros nomes conhecidos de nosso país.

Dos contos, os que mais me chamaram a atenção foram A mulher do Genival, Adereços, Escola para as noivas, O troco, Testemunha ocular e Um erro médico.

A autora com um banner de uma de suas produções

O livro é uma boa pedida para um fim de semana meio sonolento e sem graça (para dar uma acordada), dias corridos que pedem uma leitura rápida e que dê gosto ao correr do dia a dia que precise de um ardor abaianado.
M.M

Sobre a autora:

Miriam de Sales Oliveira nasceu em Salvador, Bahia. É professora formada pela Faculdade de Filosofia da Bahia, escritora por vocação, estudiosa de História e Literatura. Como pedagoga especializou-se em Piaget e Maria Montessori, ministrando cursos sobre esses mestres em várias escolas particulares de Salvador. Escreve para vários sites e jornais e é membro da Academia Poçoense de Letras e Artes, ocupando a cadeira 55. É Membro da Academia de Cultura da Bahia e da Academia de Letras Y Artes de Buenos Ayres, Secretária Executiva da Câmara do Livro da Bahia.

Vencedora do concurso “Minha estória de amor com a Perini” (out/09)
Colaborou c/a Revista “Bons Fluidos”, como estudiosa da cultura negra, folclore brasileiro e História do Brasil e de Portugal.
Palestras na II Flimar sobre Escolha de Profissões, Educação Ambiental e Internet.
Palestra em Paraty,durante a FLIP sobre A Bahia de Outrora"

Livros publicados:
Textos Seletos (Ed. Pensata)
Livro da Família (Ed. All Print)
Maktub (1º livro digital baiano), (KatePhotoArt)
Contos e Causos (Ed. Seven)
A Bahia de outrora (Via Litterarum Editora)
Antologia Cidade Vol. IV (L&A Editora)
Antologia Alma Brasileira: Um Dia de Esperança (Virtual Books)
(Fonte:https://br.linkedin.com/in/miriam-de-sales-oliveira-b2995228)

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

[Periapto da Asfixia] - Sonhos - Quando eles se tornam um pesadelo

"Quando você sabe quais são os sonhos das pessoas, você pode manipulá-las"
                                                                     Terry Pratchett


Jamais vi colocação mais verdadeira. Prattchett, sendo um grande escritor de livros cômicos que é, é um homem privilegiado por insights incríveis. Por isso sou fã dele.

No instante em que ele fala de sonho aqui, ele está falando, para mim, dos sucessos almejados que todos nós temos em nossas vidas. Ele está falando do quão presas as pessoas se tornam aos seus sonhos. Até onde vão para a realização destes e o quanto isso pode ser usado contra elas mesmas.

Segundo Zygmunt Bauman, o Gênio do Líquido, grande visionário do panorama de nossa sociedade pós moderna e inspirador de L.F. Pondé, vivemos em um mundo em que tudo se tornou fluido, fugidio, fugaz; nossas próprias identidades  já não conseguem ser mais do que uma sombra passageira dentro desse turbilhão caótico que se tornou o desenvolver-se dentro do tempo e espaço. Tornamo-nos imediatistas.

Zygmunt Bauman
Intolerantes para com a frustração, o fracasso e outras milongas mais, fragilizamo-nos para a inexorabilidade do mundo. A natureza implacável não aceita fazer nossas vontades de criança, embora seja obrigada a, por vezes obedecer alguns intentos. Mas, no final ela leva a melhor.

Nessa sede pela posse, pelo sucesso, pelo brilho, consumo e prazer, tornamo-nos também escravos. De nós mesmos. Aí é que entram os sonhos. Transformamos os nossos sonhos em objetivo mor de nossas vidas, a pedra guia de nossos atos, e nem sequer paramos para pensar que eles podem nos conduzir para um abismo.

Foto fantástica
Claro, com a ilusão de uma satisfação duradoura, todos tornam-se cegos. O sonho, a partir daí, vira uma ferramenta perigosa de condução. Ferramenta de que o capitalismo, o comércio, os aduladores, hipócritas, cínicos e mentirosos se usam para conseguir vantagens absurdas. Os sonhos perdem seu contorno inicial e transformam-se em compulsão, direcionada unicamente para a satisfação final; o orgasmo consumista que nos toma e depois perde o sentido porque já passou. Virou passado, tralha temporal. O carro do ano, a mansão, a mulher (ou homem) cobiçados: tudo isso volta a ser sapo depois do gozo. Vem aquela sensação de "Bem, não era bem isso que eu imaginei..." e "Meu deus, fiz tudo aquilo por isso?". 

Somos então pessoas manipuladas. Confundidos, sem saber o que é sonho autêntico e o que é sonho imposto, introduzido em nossas cabeças,  cedemos cada vez mais à ação. Vendemo-nos à realização deles, "a qualquer custo". Somos autômatos que compram celurares da última geração a cada 2 meses, ou "comem" uma mulher em cada esquina (ou "dormem" com um homem em cada esquina). Os horrores de se pagar pelo corpo tornam-se normais; o fantasma da ética uiva imaterial e esquecido no cemitério de fracassos onde foi enterrado. O que vale é o agora.

Thimoty Leary, PhD em Psicologia, Professor da Havard, começou a contracultura. Foi sufocado, asfixiado, por que previu uma verdade perigosa. Os americanos não suportaram o câncer que eles mesmos criaram e sustentaram com o intuito de manipular. Leary se voltou contra eles. Ele criou o movimento da Contracultura, algo que ia de encontro a essa "manipulação líquida". Fez um vídeo nos orientando (clique aqui para ver a parte um, o resto você procura no youtube) a fugir desse estado. Ele veio como um arauto de um tempo que jamais virá.

O cara foi tão importante e pouco se fala sobre ele e sua batalha. Os Beatles fizeram a música Come together para Leary. Mas nada impediu os manipuladores de sufocá-lo.

Timothy Leary - o guru do LSD

Os sonhos continuarão nos motivando, sejam eles próprios ou impostos. São o que mantém a vida suportável dentro de sua "insuportabilidade". Como ilusões de um por vir, prenunciam o concreto, mas não o garantem. São etéreos, imateriais. Frágeis como fumaça. 
 
Não são as promessas, porém, aquelas que mais nos seduzem? Não são elas que nos fazem querer crer, mesmo quando são proferidas levianamente?

Portanto, sonhemos. Jamais percamos de vista, entretanto, o  fato de sermos alvos fáceis enquanto nos mantemos cegamente no caminho da realização de um sonho. Persigamo-los cientes de que seremos aliciados. Sempre.


Finalizo o post com o clipe de Come Together, do Beattles, feito para Leary.
Abraço a todos,
Mogg Mester